quinta-feira, março 08, 2007

A culpa é da bola

Os putos são tramados. Começam por fazer de conta que não são capazes de acertar com a ponta do pé na bola, crescem, e um dia uma pessoa apercebe-se de que eles não sabem as regras do jogo. Com o meu catraio foi assim. E quando eu percebi que os outros miúdos não o deixavam jogar futebol porque ele fazia coisas indescritíveis (como pegar na bola com as mãos, que horror), claro que tive que resolver a questão o mais rapidamente possível. Mandei-o para "aulas de futebol", para aprender pelo menos as regras, e já agora se passasse a jogar alguma coisa que se visse também dava jeito, que eu até gosto de dar uns toques na bola de vez em quando e se o puto der luta tem muito mais piada. Mal eu sabia onde é que isto iria parar. Nos primeiros meses continuou tudo na normalidade. Passado algum tempo o miúdo já podia jogar nos intervalos com os outros. Depois veio a primavera, e o pesadelo começou. O miúdo passou a aparecer-me em casa sistematicamente com as calças verdes. Ainda lhe perguntei se tinha sido raptado por aliens, mas afinal a culpa era da bola, que até era azul. Jogar futebol num relvado passou a ter um significado totalmente diferente para mim. Adaptei-me, arranjei um tira nódoas fantástico (que só lavar não chega para retirar aquelas manchas redondas e verdes), e pensei que estava o assunto arrumado. Mal imaginava o quão enganada estava. Mais uns meses, e o puto vem-me com a conversa de que queria jogar no clube do bairro. E eu, inocente, pensei que era uma boa ideia, qual é o mal de o miúdo ir jogar à bola com outros miúdos e um treinador. Meses depois (será que demorou assim tanto?), começo a aperceber-me de um novo fenómeno. O miúdo não pára sossegado em casa, e também não quer ir para a rua. O que ele quer é ficar a jogar à bola no quarto dele, onde a cama de beliche tem as dimensões ideais para fazer de baliza. A sorte dele é que os vizinhos têm uma paciência de santo, e nunca se queixaram do barulho. Mas eu fiquei a perceber o meu pai, que passou a minha infância e adolescência a queixar-se do barulho das bolas em casa (eu brincava com berlindes debaixo da estante, contra as traves da estante e a parede, mais os jogos de squash na sala com o sofá a fazer de "rede", e o futebol pela casa toda, do qual até a minha mãe se queixava porque lhe partia as plantas todas). Aqui vem a paga, eu sei. Mas a história não acaba aqui. Já não me bastavam as calças verdes e o barulho do miúdo a jogar, ele passou a atirar-se para o chão como um profissional, não sei se para marcar golos ou se para se fazer à falta (mas ele está a jogar sozinho, como é que é possível estar a fazer fitas para o árbitro?). Agora tenho em casa um viciado da bola. Ele só pensa em futebol. E agora, para além de jogar sempre que pode, quer ver os jogos todos. Tenho post-its no televisor a indicar os próximos jogos a ser transmitidos. Não interessa qual é a equipa. E o puto chega ao cúmulo de querer ver os jogos de alguidares de baixo contra alguidares de cima ocorrido em 1982, na RTP memória. Não importa. É futebol, ele quer ver. E quando não o deixo, porque já é hora de dormir, tenho que lhe gravar o jogo para ele ver no dia seguinte. O que vale é que normalmente ele depois esquece-se de ver o vídeo.
A última consequência do futebol voltou a ser nas calças. O miúdo deve ter dado cabo da relva toda que havia, porque agora já não traz as calças verdes para casa. Para compensar, rompe-as todas nos joelhos. Estou tramada. Pelo lado positivo, é um espectáculo jogar com ele. O puto até tem jeito.
2 comentário(s)

2 Comentário(s):

És uma mãe bendita! Quereriam todos os miúdos ter uma mãe que os incentivasse a jogar futebol e não se chateasse de eles o verem. É perfeito. Só tens agora que o guiar para ele não cair no estilo germânico: o puto tem de ser um adepto do futebol bonito, jogado de pé para pé e onde uma finta impossível é mais bonita que um golo do meio campo.

Ah, e não esquecer que Schwalbe é uma palavra alemã e que é uma parvoíce: os jogadores talentosos nunca mergulham, protegem-se dos caceteiros que têm inveja deles.

Diverte-te puto!!! :)

By Blogger JSA, at 10:46 da manhã  

A verdade é que eu adoro futebol, mais de jogar do que de ver, é verdade, e é por isso que não me chateio com ele. Perdoa-se tudo o que está nos nossos próprios genes, é o que é. :)

By Blogger snowgaze, at 11:08 da tarde  

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