quinta-feira, setembro 14, 2006

O Toque

Os portugueses distinguem-se pelas maneiras inovadoras de utilizar aquilo que têm à disposição. O chamado “desenrascanço” que revela o pequeno McGyver que há em cada um de nós. Um clip nunca é simplesmente um clip, mas uma ferramenta que serve para muito mais do que segurar uns papéis. Um papel (qual papel?) não é simplesmente um suporte para escrita ou impressão, poderá tornar-se rapidamente, depois de convenientemente dobrado, na peça que faltava debaixo da perna mais curta de uma mesa para que esta deixe de abanar. Um talão do Multibanco pode tornar-se numa lista de compras, ou até – maravilha das maravilhas – num post. Em caso de necessidade as costas de alguém poderão servir de mesa, um par de chinelos pode transformar-se nos postes de uma baliza. E qualquer objecto pode transformar-se numa arma de arremesso.
Depois da adesão em massa aos telemóveis na pátria lusa – diz-se que já há mais que um por habitante e que até os bebés têm um! – veio a necessidade de desenrascar. É que as chamadas são caras, os SMSs também, e o povo, apesar de equipado com telemóveis de última geração, não é rico. Vai daí, alguém inventou “o toque”, ao qual quase todos nós aderimos. Não conheço nenhum estrangeiro que imagine que receber um toque no telemóvel tenha um significado, muito menos que “o toque” possa constituir uma linguagem completa. Um toque pode querer dizer tudo e mais alguma coisa. Dois então, nem se fala…
Os teenagers mandam toques uns aos outros, a horas estapafúrdias, para que o outro saiba que pensaram nele. É uma maneira de dizerem que gostam um dos outros sem gastarem dinheiro, e sem propriamente o dizerem – que isto de dizer aos amigos “gosto de ti” é uma grande pirosice. Mesmo que o destinatário esteja a dormir à hora do “toque” é imperativo que ele saiba que tem um amigo, que se lembrou dele enquanto bebia mais um shot na discoteca, depois de ser assediado por uma miúda.
Quanto aos mais velhos, têm mil e uma razões para dar toques. Aprenderam com os miúdos, e renderam-se à evidência – isto dos toques até é prático e, acima de tudo barato!
“Quando chegares a casa dá um toque” diz o meu pai. “Quando estiveres pronta dá um toque”, dizem os namorados. “Quando acabarem as compras dêem um toque, encontramo-nos no meeting point” dizem os amigos no shopping.
O toque é uma instituição. Portuguesa.
5 comentário(s)

5 Comentário(s):

Imagina agora explicar o que é isso ao pessoal, quando estava em França... Dava muito jeito por causa do roaming. O amigo alemão aprendeu rápido, as amigas brasileiras também. Quanto aos outros era aparecerem nos pontos onde toda a gente andava ;)

By Blogger LiLith, at 11:05 da tarde  

também há o toque rectal... :)

By Blogger Minhoca, at 9:28 da manhã  

Minhoca, minhoca... esse não deve ser nada agradável...

By Blogger snowgaze, at 9:30 da manhã  

Nenhum dos meus amigos "la de fora" percebe isso. Ate porque andam todos a contratos e tem uma infinidade de minutos mesais que nuna gastam, logo andam sempre a elefonar pra frente e para traz...eu é que naão tenho muita paciencia para horas de conversa!!!!

minhoca!!!

By Blogger Cromossoma X, at 4:43 da tarde  

COMO é que se pode viver sem o toque, como?! :) Qualquer dia ainda começam a cobrá-los para evitar a comunicação por toques que se verifica..tss tss...

By Blogger izzolda, at 6:23 da tarde  

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