Comer bem
Ir a um restaurante bávaro (ou se calhar é só em Munique) é uma experiência quase do outro mundo.
Para começar, não há mesas e cadeiras normais. Há umas tábuas de madeira compridas que servem de mesa, e outras tábuas de madeira compridas que servem de bancos. Um mimo. Claro que depende de restaurante para restaurante, alguns até têm cadeiras a sério, em madeira do género da que é usada nas mesas. Em geral, o ambiente é um bocado escuro. Por vezes há música (bávara) ao vivo. Nessas alturas o ambiente é parecido com o que se vive na Oktoberfest, mas com menos gente a dançar em cima das mesas. Claramente não há melhor maneira de emborcar uma litrada de Weissbier (ou outra cerveja qualquer, o que não falta é escolha) do que enquanto se ouve música "pimba" bávara.
Depois, há as empregadas. Fortes, rudes, antipáticas, são a imagem de marca de qualquer restaurante bávaro que se preze. Capazes de derrubar qualquer pessoa com o dedo mindinho - não, não estou a exagerar - nasceram sem a capacidade de sequer mostrar os dentes, quanto mais sorrir. São capazes de transportar apenas em dois braços até 20 canecas de um litro de cerveja cada, sendo que cada caneca de vidro grosso deve pesar pelo menos meio quilo, o que deve dar um peso total de uns trinta quilos pelo menos. Desempenham o seu trabalho de forma mais ou menos eficiente, com cara de más, e ar de quem vai sacar do chicote a qualquer momento. Enfim, o céu dos masoquistas deve ser parecido com um restaurante bávaro.
Para os bávaros, a comida deve ser uma coisa muito importante. Tanto em quantidade - tanta quanto possível - como em qualidade - com o maior número de calorias possível. Provavelmente é por isso que imensos pratos têm molho de natas e não há
praticamente nada saudável que se possa comer nestes locais. Além de servir salsichas de toda a maneira e feitio, um restaurante bávaro tem que servir cabrito (ou será cordeiro) em diversas modalidades, assim como o inevitável porco. E todas as partes do animal são aproveitadas. (Quando me ofereceram bochechas de porco quase me dava uma coisa.) Um prato que poderia ser simples, a sempiterna Schnitzel (panado de carne de porco), num verdadeiro restaurante bávaro vem acompanhada batatas cozidas que depois vão ao forno, e de um prato de salada de batata, alface, cenoura, e sabe-se lá que mais, além de a própria schnitzel ser suficiente para alimentar pelo menos duas pessoas. Eu não consigo comer sequer metade de uma refeição destas (e fico a chorar-me pela sobremesa que já não me cabe na barriga), mas quem me acompanha regala-se com a metade da schnitzel que eu não como. Deve ser por isso que tenho tantos amigos...
Finalmente (e passando a cerveja à frente), as sobremesas são realmente boas. Principalmente as que levam maçã e molho de baunilha quente (gelado de baunilha tambem serve mas não é tão bom). Uma fatia de apfelstrudel com molho quente de baunilha é do melhor que há, e olhem que eu não distribuo elogios assim sem mais nem menos. É tão bom (e mais uma vez, a quantidade é enorme) que às vezes só me apetece saltar a parte do almoço e passar directamente à sobremesa.
Em termos de comida, acho que os restaurantes bávaros são o céu do pessoal que adora comer em quantidade.
Nestes restaurantes tão selectos há uma coisa engraçada chamada "stammtisch". É uma mesa (ou mais) reservada permanentemente para os clientes habituais. Só as elites se podem sentar na stammtisch. Este clube restrito não inclui VIPs daqueles que aparecem na televisão, mas sim os verdadeiros bávaros, que falam em dialecto e têm a sua própria caneca de cerveja dos idos anos de 1800 e troca o passo guardada no restaurante. Claro que estes senhores se vestem unicamente com as roupas tradicionais da Bavária. O verdadeiro mistério é como é que alguém se pode tornar membro da stammtisch de um restaurante. Alguns dizem que é impossível. Outros dizem que nunca ninguém se atreveu a tentar. Pessoalmente, já vi tentativas de alguém mais atrevido de se sentar a uma destas mesas, de onde foi rápida e violentamente escorraçado. Se calhar, a stammtisch é o céu dos bávaros.
8 comentário(s)
8 Comentário(s):
Fiquei, sinceramnete, com vontade de experimentar.
Snow tambem vivo em Munique e acho o post um bocadito exagerado. Alem disso ha alguns dias atras tive visitas e num restaurante ocupamos parte de uma mesa de Stammtisch, apesar de la estarem algumas pessoas nao fomos escorracados. Nem todos os bavaros sao rudes apesar das barbas enormes e do dialecto...
Ana: todos os meus posts são exagerados. Uns mais, outros menos, mas nenhum é um retrato fiel da realidade. Alguns nem sequer refletem realidade nenhuma.
Concordo que nem todos os bávaros são rudes. E já agora, que nem tod@s @s empregad@s de restauração em Munique são antipátic@s e mal-educad@s. Mas que os há, há, e em quantidade apreciável.
Quanto à stammtisch, acho que tiveste sorte. Porque essa parte não foi inventada nem exagerada, ainda anteontem vi duas pessoas pedir para se sentarem a uma stammtisch com bastantes lugares vagos, e foram mandadas passear.
Bochechas de porco é um petisco muito conhecido! Cá em portugal também se cozinha mas dão-lhe um nome muito sui generis: burra estufada.
pois, claro que os teus post sao exagerados, mas olha que pessoas mal educadas e rabujentas, até anti-páticas... essas também as encontras em portgual e em todo o mundo. é assim. há pessoas que estao no emprego falso e há outras que procuram a discussao, a zanga. eu, falando por mim, adoro a comida bavara. o apfelstrudel, que igualmente a ti adoro, infelizmente é austríaco. mas acho que há a tal versao da baviera. quanto à comida, nem sempre é demais. mas mais vale sobrar... :D. gosto bastante do ambiente nos restaurantes típicos daqui, ou seja cervejarias. é uma cultura deles e culturas há que preservar. beijo e páscoa feliz.
É essa pequena dose de exagero que faz com que a leitura seja deliciosamente apetitosa.
Oh Snow, já viste, as mulherzitas tem mesmo que ser fortes, então à cerveja que os clientes emborcam, quando dá para torto, elas tem que impor o respeito D))).
Ainda não tive a oportunidade de experimentar nenhum desses restaurantes, mas acredito que o povo do sul da alemanha não seja tão aberto como o do norte, são os próprios alemães daqui os primeiros a dizerem isso, mas antipáticos e palermas há em todo o lado!
Gostos de ler estes teus posts sobre o sul, assim qd aí for já vou preparada e de colher de pau ;)))
Esqueci-me de uma coisa; isso dos lugares cativos na stammtisch se é assim tão dificil, provavelmente são lugares herdados não :)
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