sexta-feira, março 04, 2005

O aborto na primeira pessoa

"Eu, Teresa Maria Canais Baltazar Farinha Matoso, fiz dois abortos.
FORAM DUAS DECISÕES MUITO DIFÍCEIS, contrárias até à vontade do meu marido. Fi-los às 8 semanas de gestação, em condições não apropriadas e até humilhantes. Lembro-me de uma telefonia com música altíssima, para não se ouvirem os meus gritos de dor (por não poder ter médico anestesista a acompanhar-me, não fui, obviamente, anestesiada). Paguei o correspondente hoje a 1000 euros, porque a parteira era da confiança da minha ginecologista, que, no mesmo dia, me levou para uma clínica particular de Lisboa, só acessível às classes altas e médias altas, onde fui devidamente tratada. Curso acabado, carreira profissional solidificada, tive então mais dois filhos, que, muito provavelmente não poderia ter tido, caso não tivesse tido a possibilidade económica que me permitiu a escolha de uma boa parteira e, porque surgiram complicações, o internamento numa clínica de luxo, onde não eram feitas perguntas. Caso contrário, teria ou morrido ou ficado estéril.
Acrescento aquilo que todos sabem, mas que eu vi: a clínica era frequentada por mulheres de gente importante reponsável pela legislação anti-aborto.
Não me sinto orgulhosa por ter feito dois abortos, nem confortável por o dizer publicamente. Fi-lo porque quis relatar, na primeira pessoa, aquilo que é do conhecimento geral. Fi-lo como forma de luta pela obtenção de um direito que é justo. Fi-lo para enfrentar, em jeito de desafio, as autoridades competentes. Por último, gostaria de afirmar que não permito opiniões sobre o que poderia ou deveria ter feito. Nenhuma mulher faz um aborto de forma inconsciente ou leviana. O sentimento é sempre de sofrimento".
Retirado daqui.
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